Focada na qualidade, safra brasileira de café promete alta rentabilidade para o setor em 2020
Produtor e empreendedor do comércio de cafés especiais, Bruno Souza vê novos mercados de consumo que o produto mineiro e brasileiro de alta qualidade e certificado pelas práticas sustentáveis nas plantações poderá conquistar em 2020, ano de natural renovação do fôlego das lavouras. “O crescimento é constante desse segmento no país há pelo menos três anos. Café especial sempre teve preço. Cheguei a pagar R$ 3.500 a saca (de 60 quilos) quando o preço de mercado (cotado em bolsa de valores) era de R$ 380”, afirma.
Depois de um ciclo de baixa neste ano, a produção do grão no Brasil é estimada entre 58 milhões e 66 milhões de sacas nas previsões mais otimistas. Sabor e pureza apurados é que prometem impulsionar os cafés do Brasil e de Minas, responsáveis por 50% a 55% da oferta nacional.
A qualidade não só deve melhorar a remuneração dos produtores como também permitir a expansão da presença das marcas brasileiras e mineiras no mercado internacional. As previsões dos representantes do setor cafeeiro são de que o ano deve ser de colheita cheia. Ainda assim, não deve quebrar recordes, já que mudanças climáticas bruscas prejudicaram as lavouras em 2019. Se as chuvas e o tempo seco não atrapalharem no ano que vem, o foco na qualidade deve caracterizar a safra de café em 2020, segundo fontes do setor ouvidas pelo Estado de Minas.
Para o presidente da Comissão Nacional do Café da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Breno Mesquita, o Brasil se consolida cada vez mais como um produtor de café de qualidade elevada e a maior contribuição para esse título se deve a Minas Gerais. “O que era nicho virou tendência. Investir na produção de café de maior qualidade é uma alternativa para o produtor fugir do produto cotado em bolsa e vender a um maior valor agregado”, afirma. A Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA) estima que 16,2% da produção brasileira do grão em 2018 tenha sido de cafés considerados especiais.
O dirigente da CNA acredita que essa faixa de participação tende a crescer. “Este ano, foi difícil produzir café especial e mesmo assim conseguimos. O Brasil tem tudo para se consolidar como o maior fornecedor”, justifica Mesquita. De acordo com o Conselho de Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), o país exportou de janeiro a novembro deste ano 6,9 milhões de sacas de cafés diferenciados, 18,6% do total enviado para o exterior. O valor representa crescimento de 23,4% em volume com relação ao mesmo período do ano passado.
Por uma questão fisiológica da planta, a produção de café funciona em bienalidade. Ou seja, se em um ano a produção é mais fraca, no ano seguinte a tendência é de alta. Como 2019 foi um ano de baixa para a cafeicultura, a projeção de consultorias de agronegócio é de uma safra robusta em 2020. Neste ano, balanço divulgado pela Federação da Agricultura e Pecuária de Minas Gerais (Faemg) estima a produção do estado em 24,252 milhões de sacas até novembro, representando 27,3% de queda frente ao mesmo período do ano passado. A entidade trabalha com projeções de 46 milhões a 48 milhões de sacas para a safra brasileira em 2019. Para 2020, aposta em até 58 milhões de sacas, com metade delas originadas em Minas.
Clima
Cooperativas de produtores mineiros temem não alcançar as previsões mais otimistas de safra se houver uma repetição de problemas climáticos que afetaram as lavouras nos últimos meses. José Marcos Magalhães, diretor-presidente da Cooperativa dos Cafeicultores da Zona de Varginha (Minasul), no Sul do estado, tem certeza de que a safra de café arábica (variedade que ocupa 98% dos cafezais mineiros) deve ser menor no ano que vem do que a de 2018, devido a uma chuva que veio fora de hora. A previsão dos técnicos da Minasul é a produção de 60 milhões de sacas do país em 2020.
“Em dezembro de 2018, tivemos muita chuva. Em janeiro de 2019, excesso de temperatura, e durante o inverno deste ano uma friagem”, explica. Por essas razões, Magalhães avalia que o clima prejudicou a floração das plantas em setembro e consequentemente a quantidade produzida. “O que pode compensar é a produção de café conilon, que deve aumentar”, afirma. No entanto, Magalhães diz que a qualidade dos grãos, sim, está assegurada.
Com isso, a capacidade de exportação dos produtores deve crescer. A última previsão, no ano, da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para a safra do ano que vem ainda não foi divulgada. A companhia vem trabalhando com 50 milhões de sacas, redução em relação a 2018 – o último ano de safra cheia – que registrou 61,7 milhões de sacas, segundo o Conab.
Produtividade
O técnico especial do café da Secretaria de Agricultura do Estado de Minas Gerais Niwton Castro Moraes afirma que a boa produtividade é outro fator que favorece a cultura. “Houve um período de estiagem de chuvas em outubro e o pessoal ficou preocupado. Isso significaria uma perda já no nascedouro da safra. Mas pelo menos por enquanto percebemos que a influência não foi tão grande”, explica.
Mesmo com uma produção total maior, um aumento na produtividade das lavouras, medida em sacas por hectare, não está garantido para 2020. Segundo Breno Mesquita, o Brasil tem a maior produtividade do mundo, algo em torno de 30 sacas por hectare. “As lavouras estão ficando mais produtivas, principalmente no estudo da planta. O Brasil está fazendo o dever de casa”, conclui. Ainda assim, o clima tem que ajudar os esforços do produtor.
Segundo Niwton Castro, a implementação de novas tecnologias e processos cada vez mais avançados firmou tendência. “É um crescimento não exatamente constante, mas percebemos aumento em todas as safras”, diz. Nos últimos 20 anos, a produtividade das lavouras no Brasil e em Minas mais quase dobrou. As lavouras mineiras se espalham por 460 municípios.
Ásia e Leste Europeu à vista
Os cafeicultores brasileiros devem ser recompensados, em 2020, com a recuperação dos preços do grão e a expansão para novos mercados de consumo no exterior. Depois de uma queda forte nos últimos anos, as cotações na bolsa de valores estão voltando a subir. Como alguns países produtores diminuíram a oferta, o consumo deve ser maior do que a produção em 2020, fazendo valer as leis da economia. Isso cria uma escassez no mercado, o que faz as cotações subirem. Segundo o presidente do Conselho Nacional do Café da CNA, Breno Mesquita, o preço da saca de 60kg, há três meses, girava em torno de R$ 400, e hoje já chega a R$ 500.
“A previsão é que o produtor entregue a saca, em dezembro de 2020, a R$ 550 ou R$ 565”, afirma. O produtor Bruno Souza, que também dirige a Academia do Café, loja que serve cafés especiais de todo o país e que oferece cursos de formação no setor, vê a Ásia e o Leste Europeu como novos mercados promissores para o café brasileiro, além dos Estados Unidos, que já é o maior importador do produto.
“Há mercado para cafés especiais em qualquer lugar. Se não vender pra fora é quase impossível sobreviver se não for grande produtor”, diz. De olho na expansão internacional das vendas do café e de outros produtos do agronegócio brasileiro, a CNA estabeleceu um escritório em Xangai, na China, e vai abrir uma representação em Cingapura.
De acordo com o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), as vendas externas de janeiro a novembro totalizaram 37,4 milhões de sacas, crescimento de 18,4% em relação ao mesmo período de 2018. Já a receita foi de US$ 4,7 bilhões, alta de 2% comparada a do ano passado. A conclusão é de que o desempenho deste ano foi o melhor dos últimos cinco anos. Segundo o conselho, com exceção do Reino Unido, os 10 principais países consumidores do café brasileiro aumentaram as importações do grão. (com Marta Vieira)
Fonte: O Estado de Minas